A cúpula do Ministério Público Federal (MPF) considera desproporcional exigir que as vítimas que tiveram descontos indevidos em seus benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) promovam ações ativas para ser ressarcidas, mesmo diante de evidências claras da irregularidade.
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Ao Broadcast Político, procuradores que acompanham os desdobramentos da Operação Sem Desconto ainda destacaram a “responsabilidade solidária” da União pelas fraudes — o que implica o dever do governo de ressarcir os aposentados e pensionistas lesados por descontos indevidos.
As ponderações partiram dos procuradores Nicolau Dino, da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, e Alexandre Camanho, da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, a qual cuida de investigações de corrupção e improbidade istrativa.
Ao cobrarem o “ressarcimento de forma mais proativa, e não mediante provocação” do governo, eles lembram que, no centro do inquérito, está o crime de inserção de dados falsos em uma base de dados da istração pública federal.

“Determinadas pessoas sofreram descontos involuntários, notificados e inseridos em um banco de dados do INSS. O INSS sabe precisamente quem são as pessoas que foram lesadas. Então seria completamente desproporcional que essas pessoas que foram lesadas à revelia de um ato de vontade agora precisem de um ato de vontade para se verem ressarcidas”, afirmam.
A procuradoria considera, por exemplo, que com a identificação das sete empresas de fachada sob investigação já há um “raio-X de um grupo que precisa ser ressarcido de imediato”. “Essas pessoas já são sabidamente lesadas. Elas não precisam comunicar o governo, porque na realidade o INSS já sabe que essas pessoas sofreram descontos indevidos. Não há necessidade de que essas pessoas requeiram o seu ressarcimento”, indicam os procuradores.
MPF expediu recomendação ao INSS sobre ressarcimento
O MPF chegou a expedir uma recomendação para os ressarcimentos, há duas semanas, em 19 de maio. Entre outros pontos, o órgão sugeriu ao ministro da Previdência, Wolney Queiroz, que ocorra, em até 30 dias, o ressarcimento de pessoas presumivelmente vulneráveis, como os quilombolas, indígenas, aposentados por atividades rurais e pessoas que percebem até um salário mínimo de benefício
Nesse mesmo documento, o MPF discordou expressamente de os aposentados terem de questionar os descontos indevidos, via aplicativo. Depois da recomendação, o Ministério da Previdência abriu a possibilidade de beneficiários do INSS questionarem, presencialmente, supostos casos de fraudes.
Como mostrou o Broadcast Político, a procuradoria recomendou ao INSS o reconhecimento “imediato” das vítimas das fraudes bilionárias assim como a “devolução imediata”, com recursos públicos, dos valores que foram descontados indevidamente de aposentados e pensionistas. A avaliação acaba conflitando, em parte, com o discurso do governo Lula de que o ressarcimento dos aposentados fraudados deve advir dos investigados da Operação Sem Desconto.
Para a procuradoria, não há uma “estrita vinculação” entre a recuperação dos bens dos fraudadores e o ressarcimento, e o ressarcimento deve advir, ou não, dos bens “encontrados com os artífices dessa organização criminosa”. Isso porque, segundo as investigações, as fraudes ao INSS ocorreram com a “coparticipação de agentes públicos”.
“Como há uma participação muito forte, intensa, decisiva até, de agentes públicos, evidenciaria no mínimo uma responsabilidade solidária da União em relação àquilo que corresponde aos danos aos beneficiários, a aposentados e pensionistas. Haveria uma culpa, no mínimo, inegável, em relação aos agentes que vão atuar em nome do Estado. Na medida que você tem essa responsabilidade solidária, quer dizer, a União e o INSS, deram causa (às fraudes) de alguma forma — ou por omissão ou por um protagonismo muito evidente de agentes públicos —, ela também tem responsabilidade por viabilizar o ressarcimento”, explicam os procuradores.
A Procuradoria mantém um canal aberto de interlocução com o Executivo e busca “compartilhar soluções”. Ao mesmo tempo, não está descartada uma eventual ação judicial, “no horizonte”.
Assimetria
Com relação às investigações, hoje o MPF faz um “nivelamento” das apurações sobre as fraudes nos Estados, ao mesmo tempo em que busca informações “para fazer com que a receita do crime retorne” aos cofres públicos.
Já foram mapeadas pelo menos 23 investigações, no MPF, sobre a participação de servidores do INSS e de associações no esquema de descontos indevidos. Os inquéritos tramitam no Distrito Federal, em São Paulo, Minas Gerais, Sergipe, Ceará, Paraná e Rio Grande do Sul.
A 5ª Câmara diz que a PF e os órgãos do Executivo “já tinham um conhecimento nacional das irregularidades, mas não houve uma partilha dessas informações”. “Há uma assimetria de informação. Nós estamos agora buscando o que está acontecendo em cada Estado onde houve essas irregularidades”, dizem os procuradores.

A procuradoria entende que a falta de comunicação da Polícia Federal com a PGR levou a declinações de atribuição em âmbito nacional. Por exemplo, alguns procuradores entenderam relatos de fraudes ao INSS como casos específicos de estelionato. Considerando que os procedimentos estavam dissipados, há a perspectiva de o buraco das fraudes ser “muito maior”.
“Se nós tivéssemos sabido disso de antemão, poderíamos ter dado um enredo uniforme nacional. Mas o Ministério Público soube disso, às vésperas da deflagração da operação da Polícia Federal. Hoje existe uma assimetria procedimental (no MPF). Em favor da eficiência da investigação e em benefício do lesado, a procuradoria em âmbito nacional está tentando uniformizar os procedimentos criminais e de improbidade istrativa para que a gente possa buscar inclusive medidas cautelares que levem inclusive a uma indisponibilidade patrimonial”, explicam os procuradores.
Redação Oeste, com informações da Agência Estado
Certamente a quadrilha já deu “sumiço” no produto do crime. A demora em se tomarem as providências necessárias só auxilia os criminosos.