Foto: Revista Oeste/Midjourney
Edição 230

Pense antes de postar

Lançado há oito anos, o romance O Império do Oprimido projetava através da ficção o que agora se concretiza como realidade

A repressão estatal no Reino Unido contra cidadãos por suas postagens em redes sociais, inclusive com prisões sumárias, mostra que o novo autoritarismo está disseminado pelo mundo. E se manifesta também nas sociedades mais organizadas — que já foram conhecidas como “Primeiro Mundo”.

Numa ofensiva arrojada contra a liberdade de expressão — como sempre fantasiada de “combate à onda de ódio” —, o recém-empossado primeiro-ministro Keir Starmer está intimidando os críticos das políticas de imigração. O governo trabalhista cunhou o alerta “Pense antes de postar”. Lançado há oito anos, o romance O Império do Oprimido (de autoria deste signatário) projetava através da ficção o que agora se concretiza como realidade.

Keir Starmer, primeiro-ministro britânico | Foto: Henry Nicholls/Pool via Reuters

Segue trecho do livro.

“Concluídos os discursos, subiu ao pequeno palco o compositor Zé Brasil, acompanhado da banda Cafuné. Antes do primeiro acorde, o artista gritou a palavra de ordem do movimento pela proibição das ofensas na mídia: ‘Pense bem — antes de falar mal’. 

Só aí Pedro entendeu o recado de Cristal: Pense Bem era o projeto que punia sumariamente qualquer discriminação nas mídias. Virou-se para a namorada jornalista:

— Clara, daqui a pouco você só vai poder falar o que eles quiserem ouvir. 

— Exagero, Pedro — interveio Luana. — O Zé Brasil não participaria de um movimento contra a liberdade de expressão. 

(…)

O Guia ficou fora de si e mandou Carmelo ligar para Malabares: ‘O Congresso vai aprovar o controle da mídia agora!’.

Malabares desceu ao plenário e foi com seu telefone de orelha em orelha, como ordenou o Guia. Cada líder partidário abordado pelo publicitário careca achava que se tratava de uma pegadinha — para então levar um susto e ouvir o presidente em pessoa do outro lado da linha. E o recado era claro: a lei Pense Bem, estabelecendo punição sumária para discriminações na mídia, tinha de ser votada imediatamente — ‘senão a partir de amanhã acabou o sorriso’. 

O recado foi muito bem compreendido, e o rolo compressor da bancada governista garantiu a aprovação em tempo recorde. Agora os jornalistas iam ter que pensar bem antes de falar mal, como dizia o slogan da nova lei. E Paulo França ia ter que engolir o que disse — e o que mais viesse a dizer — contra o governo popular.”

O livro é de 2016. Estamos em 2024. Como estaremos em 2032?

Livro O Império do Oprimido, de Guilherme Fiuza | Foto: Divulgação

Leia também “A raquetada redentora”

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10 comentários
  1. Marco Aurélio Oliveira De Farias
    Marco Aurélio Oliveira De Farias

    E esta semana a prisão de Pavel Durov, fundador do Telegram.

  2. Valesca Frois Nassif
    Valesca Frois Nassif

    A pergunta final traduz em poucas palavras todo o temor que venho acumulando há algum tempo!

  3. DONIZETE LOURENCO
    DONIZETE LOURENCO

    Fiuza, pareceria ficção mas virou realidade e agora vivemos sob um Estado de exceção.
    O Imperador Alexandrus I, o Calvo, e seu súdito e cúmplice Rodrigo Pacheco devem ser removidos dos seus cargos e responderem por seus atos.

  4. Robson Oliveira Aires
    Robson Oliveira Aires

    Fiuza, em 2016 você foi visionário. Incrível como 8 anos depois a realidade está imitando a ficção. Tempos sombrios.

  5. Daniele Mendes Neves Gonzaga
    Daniele Mendes Neves Gonzaga

    Amo os textos do Fiuza. Curtos, sucintos e diretos! Mais um para a galeria dos espetaculares!

  6. Brian
    Brian

    No Brasil, podemos agradecer a RODRIGO PACHECO pela destruição de todas as leis e pela ditadura comunista em curso.

  7. Thiago da Rocha Rodrigues
    Thiago da Rocha Rodrigues

    Sem liberdade de expressão não há democracia. A Europa globalistas já deixou de ser democrática. Eles vivem uma espécie de fascismo globalistas e não nacionalista.

  8. Reginaldo Corteletti
    Reginaldo Corteletti

    Tempos difíceis, caro Fiuza. Iniquidades sem fim.

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