“Naquela manhã aquelas botas carregaram
Lee Miller por Dachau, e agora ela está
pisando a fuligem daquele lugar, e aquele
horror, e degradação no tapete de banho
bonito e limpo de Hitler. E isso prova que ela
não está sentada lá como uma convidada”
(Antony Penrose, filho de Lee Miller)
A artista surrealista norte-americana Elizabeth “Lee” Miller eternizou uma das mais improváveis e indeléveis imagens da história ao posar para uma fotografia sentada dentro da banheira de Adolf Hitler, no apartamento dele em Munique. O ditador nazista havia se suicidado naquele mesmo dia em Berlim, na Alemanha. A foto foi tirada pelo colega fotógrafo David E. Scherman, da revista Life, em 30 de abril de 1945.
A lendária Lee Miller foi uma das cinco fotojornalistas credenciadas que acompanharam tropas americanas em campos de concentração liberados e documentou, de maneira única, a barbárie dos últimos dias da Segunda Guerra Mundial.
De Dachau, ela e Scherman foram para o apartamento particular de Hitler em Munique no dia em que ele cometeu suicídio, durante o cerco aliado de Berlim. Ela simulou estar se lavando na banheira do Führer e pediu ao amigo Scherman que a fotografasse. Posicionou uma fotografia do ditador no canto e deixou deliberadamente suas botas, enlameadas com a terra dos campos de concentração, em cima do tapete branco do banheiro.

Na vida incomum de Lee Miller há dois períodos célebres. O primeiro começou em 1926, quando ela atravessou a rua distraidamente na frente de um carro e foi puxada de volta para a calçada por um estranho bem vestido. Era ninguém menos que Condé Nast — o magnata dono da editora de revistas que leva seu nome —, que a salvou de ser atropelada. Impressionado com sua beleza, Nast a convidou para ser modelo das revistas Vogue, Harper’s Bazaar e Vanity Fair. Logo ela ou a ser capa das edições americana e britânica, em março de 1927. Foi retratada pelos notáveis fotógrafos de moda Arnold Genthe, Nickolas Muray e Edward Steichen. Aos 22 anos, em 1929, ela foi para a França e se tornou aluna, musa e amante do artista surrealista Man Ray. Continuou modelando, tanto para Man Ray quanto para o assessor da Vogue em Paris, George Hoyningen-Huene.

O segundo período célebre foi durante a Segunda Guerra Mundial, em 1943, quando Miller se tornou correspondente de guerra credenciada pela Vogue e, no ano seguinte, juntou-se ao fotojornalista da Life David E. Scherman. Juntos, eles seguiram a 83ª Divisão de Infantaria do Exército americano. Miller se tornou uma das primeiras mulheres fotojornalistas a fazer isso.


Miller viajou pela Europa e fotografou a Batalha de Saint-Malo, a Libertação de Paris, hospitais de campanha na Normandia e a libertação dos campos de concentração de Dachau e Buchenwald. Suas fotografias são consideradas algumas das primeiras evidências visuais do Holocausto. Seu trabalho, sempre honesto com suas emoções, trouxe um vislumbre horripilante das selvagerias cometidas pelos nazistas.
Miller se casou com o artista Roland Penrose, com quem se mudou para uma fazenda (Farley Farm House) em Sussex. Ali, afundou-se no alcoolismo e na depressão, em decorrência do estresse pós-traumático que a guerra lhe causou. Mais tarde, ela se recuperou e se reinventou como uma cozinheira especialista e treinada pela Cordon Bleu, com destaque em revistas femininas.

Depois que Miller morreu de câncer, em 1977, seu filho Antony Penrose, que nada sabia sobre a carreira fotográfica da mãe, descobriu cerca de 60 mil negativos, 20 mil impressões e folhas de contato, documentos e escritos encaixotados no sótão da Farley Farm House.
Antony trabalhou para arquivar e promover esse acervo fotográfico, que havia sido esquecido pelo mundo da arte. Por meio de seus esforços, Lee Miller se tornou tema de diversas exposições, biografias e monografias, além de um filme biográfico lançado em 2023, chamado Lee, estrelado por Kate Winslet.
Daniela Giorno é diretora de arte de Oeste e, a cada edição, seleciona uma imagem relevante na semana. São fotografias esteticamente interessantes, clássicas ou que simplesmente merecem ser vistas, revistas ou conhecidas.
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Que maravilha! Além de nos presentear com fotos de inegável importância e qualidade pela beleza e também conteúdo informativo, ainda somos brindados com verdadeiras aulas de história , que nos instigam a buscar mais conhecimento sobre fatos e pessoas marcantes. Muito obrigada, Daniela!
Obrigada pela mensagem, Valesca 🙂
Daniela, obrigada por nos apresentar essa mulher incrível, corajosa, forte,sensível que desafiou os padrões de uma época machista! Nunca havia ouvido falar de,Lee Miller, como pode a história manter nas sombras alguém tão importante e fascinante! Você nos surpreende mais a cada semana.
Lee era realmente incrível. Obrigada pela mensagem, Thais.
Como é gratificante ‘ear’ pelos artigos da Oeste e deparar com uma matéria como esta!
Ficará marcada em minhas visitas semanais diante da interessantíssima informação que nos traz aqui.
Certas preciosidades da história muitas vezes ficam esquecidas/perdidas pela falta de divulgação de quem as detém, óbvio por não terem o espaço para serem transmitidas. Parabéns a você Daniela e à revista Oeste!
Estarei sempre por aqui visitando-a semanalmente.
Obrigada! Venha sempre visitar ou revisitar esta seção. 🙂
Não a conhecia!
Obrigada por despertar esse conhecimento! Seu texto aliado ao trailer, mostra o quão intrigante e forte foi essa mulher!
Obrigada, Rosely <3
Giorno você é uma santa da história você sabe oxigenar nosso cérebro
Obrigada, caro Erasmo. 😉
Sensibilidade, arte, história…suas matérias e imagens são um primor. Evocam aspectos de muita delicadeza, coisa de que todos necessitamos tanto, sobretudo nesses tempos brutos que temos vivido. Parabéns pelo talento e obrigada por nos presentear com a beleza do seu trabalho.
Obrigada, também, por me presentear com esta linda mensagem, Elizabeth. 🙂