A multiplicação dos deputados

A Câmara dos Deputados resolveu aumentar sua própria composição — de 513 para 531 integrantes. É uma ideia genial. O Brasil não tem nada mais importante e mais urgente do que isso para tratar. Aliás, foi aprovado regime de urgência para a votação da matéria. É uma sensação boa ver o Brasil funcionando.

Coloque-se no lugar de um dos aposentados mais vulneráveis e mais pobres que foram roubados pela quadrilha do INSS, sentindo falta daquele dinheiro descontado indevidamente, talvez uns R$ 50, vendo os deputados torrarem uns R$ 50 milhões para ganharem 18 cadeiras novas. Que mobília chique!

Mas os brasileiros aviltados e humilhados pela corja politicamente protegida se encherão de esperança. Quem sabe com esses 18 novos deputados eles fazem a I do INSS? Vai ver era isso que estava faltando.

Quem sabe com mais 18 coleguinhas eles aproveitam o embalo e fazem valer a vontade da maioria — e não ficam mais na arquibancada vendo o presidente da Casa decidindo tudo sozinho com seus parceiros de outros Poderes? Será que era isso que estava faltando para a Câmara despertar da sua letargia?

Mas aí esses 18 têm que ser muito bons, né? Será que dá pra botar na lei a ressurreição do Rui Barbosa, do Roberto Campos, do Affonso Arinos e mais 15 desse quilate? Porque se a categoria dos novos 18 estiver na média da composição atual pode dar uma sensação de frustração, não? Vai que eles só falem na tribuna o que o sistema permitir? O eleitorado pode ficar com a impressão de que só aumentou o drama.

Outra medida que vai merecer urgência urgentíssima é a anulação de tudo que a Câmara decidiu nas últimas décadas. Se o motivo da expansão agora é a atualização da representação de acordo com o censo, e essas 513 cadeiras estão aí há um tempão — e a população nunca deixou de crescer e se redistribuir —, então estava tudo errado. I do PC, impeachment do Collor, emenda da reeleição, I dos Correios, impeachment da Dilma, reforma da Previdência… Pode anular tudo, que a representação estava desatualizada. E os mensaleiros vão ter que redividir a grana, de acordo com o censo. E o bom senso.

O mais interessante é que deputados do PL votaram a favor do puxadinho. O liberalismo do Partido Liberal não resistiu à proposta de aumento da máquina estatal. Devem ter pedido a eles com jeitinho. Aí a pessoa fica sem jeito de contrariar mesmo.

O país com um déficit crescente que deteriora as contas públicas e faz a inflação estourar a meta — e os liberais de oposição dando uma forcinha pro aumento do prejuízo. Deve ser a tal da consciência de classe.

Enfim, parabéns a todos os grandes brasileiros que tiveram a coragem de entrar para a história inchando um Poder decadente e esfaqueando o contribuinte num momento de penúria. Mas não vão se acanhar agora! Precisamos de mais vereadores, mais senadores e pelo menos mais dois presidentes da República (e duas primeiras-damas), porque está mais do que claro, segundo o censo, que um só não dá conta de todos os banquetes mundo afora.

Vamos com tudo, rapaziada, que ninguém tá vendo.

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